Title: CAMINHOS EPISTEMOL
1CAMINHOS EPISTEMOLÓGICOS NA ELUCIDAÇÃO DA
LOUCURA Contribuições da Psicologia
Existencialista
Profa. Dra. Daniela Ribeiro Schneider Depto de
Psicologia / UFSC Núcleo de Pesquisas em
Psicologia Clínica www.psiclin.ufsc.br
danis_at_cfh.ufsc.br
2PARTE 3
3A Psicopatologia concebida em termos
pós-psiquiátricos contribuições do
Existencialismo Sartriano
4Sartre no contexto da psicopatologia
- Sartre esteve inserido no ambiente da
psicanálise, psiquiatria e psicologia clínica
francesa de seu tempo (anos 1930-70), a luz do
qual forjou suas críticas e proposições para o
domínio da psicopatologia. - Foi um dos principais autores que fundamentou o
movimento anti-psiquiátrico psiquiatras como
Laing Cooper, Basaglia, Van Den Berg, Keen,
etc, nele se embasaram.
5A psicopatologia em Sartre
- A compreensão da temática psicopatológica em
Sartre deve ser realizada no conjunto da sua obra
técnica
6Transcendência do Ego
- Distinção entre
- consciência (subjetividade) e ego (sujeito)
- O que unifica as consciências é o objeto (noema)
e não o eu. - Situações e episódios antropológicos e
psicofísicos experimentados pelo indivíduo,
consolidam-se em estados, ações e qualidades, que
acabam por produzir o eu, que, portanto, é
resultante desse processo. - O ego é uma subjetividade objetivada.
- O ego é um objeto do mundo como outro qualquer
transcendente.
7Implicações para a psicopatologia
- Em Sartre, ao contrário de outras concepções,
podemos ter a clareza de que não é a consciência
que adoece, já que ela é pura relação às coisas,
puro nada. Quem tem possibilidade de adoecer é
o sujeito. - Dessa forma, a patologia é uma perturbação
(sempre psicofísica) que acontece enquanto
movimento do sujeito no mundo, resultante de sua
história de relações. - Sendo assim não cabem noções como conflitos de
idéias, problemas do mundo interno, problemas
mentais, como aparecem na psiquiatria clássica e
na psicanálise.
8Implicações para a psicopatologia
- A psicopatologia em Sartre também não é uma
complicação existencial, pois a existência também
não adoece. Ela é, sim, uma complicação
psicológica. Expliquemos melhor problemas
existenciais acontecem sempre - rompimento de uma
relação amorosa, morte de uma pessoa
significativa, dificuldades com amigos, relações
familiares tumultuadas, etc, - mas esses
problemas, sejam no âmbito social ou sociológico,
não necessariamente perturbam a personalidade do
sujeito. Se, no entanto, eles se tornarem
variáveis que interfiram ou levem a uma
perturbação da personalidade, nesse caso, sim,
engendram uma complicação psicológica.
9Crítica da Razão Dialética teoria dos conjuntos
práticos
10Constituição dos processos psicológicos e
patológicos
11Tecido sociológico variável fundamental na
psicopatologia
12Constituição do cogito
13Sistema de racionalidades e atmosfera humana
14Atmosfera Humana episódio de Van den Berg
- É inverno. A noite está caindo e eu me levanto
para acender a luz. Olhando para fora vejo que
começou a nevar. Tudo está coberto pela neve
brilhante, que está caindo silenciosamente do céu
encoberto. (...) Esfrego as mãos e aguardo a
noite com satisfação, pois, faz alguns dias,
telefonei a um amigo convidando-o a vir ter
comigo esta noite. Dentro de uma hora estará
batendo à minha porta. (...) Ontem comprei um boa
garrafa de vinho, que coloquei à distância
apropriada do fogo. (...) Meia hora mais tarde
toca o telefone. É o meu amigo, a dizer que não
poderá vir. Trocamos algumas palavras e marcamos
novo encontro para outro dia. Quando torno a
colocar o fone no gancho, o silêncio do meu
quarto ficou mais profundo. As próximas horas se
parecem mais longas e mais vazias.(...) Dentro de
alguns momentos estou absorto num livro. O tempo
passa lentamente. Ao levantar os olhos por um
momento, para refletir sobre um trecho pouco
claro, a garrafa, perto do fogo, chama a minha
atenção. Percebo mais uma vez que o meu amigo não
virá e volto à minha leitura (Van Den Berg,
1981 36).
15Psicológico Função noemático-noética
Função
16Caso Clínico Silvio
- Psicóloga responsável
- Dra Daniela R. Schneider
- CRP12/00443
17Caso Clínico SilvioO fenômeno
- Sílvio tem 38 anos, solteiro, veio morar em
Florianópolis há aproximadamente 10 anos atrás,
quando veio cursar Engenharia Mecânica na UFSC.
Mora sozinho. Tem uma namorada há mais de um ano.
Trabalha atualmente em uma empresa de elevadores,
como engenheiro responsável. Tem poucos amigos em
Florianópolis. - No seu curso de engenharia mecânica cursou a
disciplina de Refrigeração e Ar Condicionado
pela quinta vez. Conseguiu a autorização para
cursar pela última vez a disciplina em função de
uma declaração de estar fazendo psicoterapia para
buscar resolver o problema. Seria sua última
oportunidade antes de ser jubilado. Teve
dificuldades com as disciplinas do curso desde o
primeiro semestre, principalmente as ligadas à
área da matemática. Na sua história escolar nunca
foi um aluno exemplar, repetiu o ano no 2º e 3º
colegiais e sempre pegou recuperação. - Depois de receber orientação psicológica
conseguiu concluir a disciplina e se formar. - O Caso iniciou no segundo semestre de 2004 e foi
concluído com 80 sessões.
18Caso Clínico SilvioO fenômeno
- Nascido no interior do RS, família de origem
italiana. É o mais velho de três irmãos, sendo o
do meio de 36 anos, dono de uma padaria e a mais
nova, de 18, portadora de Síndrome de Down. Tem
uma relação distante com a mãe, operária
aposentada da indústria têxtil, devido às
inúmeras cobranças que esta lhe faz, por isso,
Sílvio evita de conversar com a mãe sobre sua
vida de maneira geral, pois experimenta-se
pressionado por ela. A mãe estudou até a quarta
série e é considerada por ele limitada de
conhecimentos e de experiências de vida, não
podendo contribuir muito com sua opinião,
afirma. - O pai faleceu em 89, quando Sílvio tinha 21 anos,
por problemas do coração. Era também operário.
Sílvio descreve o pai como uma pessoa violenta,
rude no trato. O pai agredia a mãe fisicamente e
Sílvio tinha temor da violência do pai.
19Caso Clínico SilvioPadecimentos
ocorrências/sintomas
- Ocorrências/Sintomas
- 1- Tensão de ser aparecia em várias situações
de trabalho, de estudo, com a namorada e a
família. - 2- Rigidez muscular - principalmente nos ombros e
braços, em situação de tensão. - 3- Impotência de ser - frente a situações de
tensão advinda do sócio-histórico, tem a certeza
de não poder intervir, mudar os rumos dos
acontecimentos, ficando em uma atitude de
espreita. - 4- Aprisionamento no reflexivo o paciente
chama este sintoma de Paralisia de Análise
assim descreve uma série de pensamentos do qual é
acometido que o impedem de executar ou prosseguir
em uma determinada tarefa, paralisando-o, nos
estudos e trabalho, por exemplo. - 5- Ansiedade tem dificuldades de identificar sua
ocorrência, quando percebe já está tomado por
ela. Aparecia em situações de prova, hoje em
situações de trabalho, quando tem que resolver
problemas técnicos. - 6- Prostração após terminar uma prova ou um
episódio de tensão experimenta-se prostrado,
parece que todas as minhas forças se exauriram.
Fica triste, sem vontade de fazer as coisas
cotidianas.
20Caso Clínico SilvioEpisódio sociológico atual
- 1) Era domingo, dia 09/07/06, fui no Banco do
Brasil pegar folhas de cheque. Precisei grampear
o talão e minha namorada me chamou atenção de uma
máquina nova que eu não conhecia para grampear
talões. Na hora me deu um mal estar, uma
ansiedade de como lidar com a máquina, fiquei
tenso. Não sabia como ela funcionava e teria que
tentar em público, fiquei envergonhado de não
conhecê-la, pois parecia um cara do interior, um
colono. Se eu tivesse dificuldade de usá-la
apareceria frente a qualquer um que estivesse ali
com um cara ignorante, ia ter de me expor em
público sem dominar a situação, poderiam rir de
mim. Minha namorada foi lidando com naturalidade,
ela também não sabia e foi se dispondo a tentar e
isso amenizou a atmosfera. Deixei ela tentar, fui
acompanhando o movimento dela, pois não conseguia
ser o protagonista da situação.
21Caso Clínico SilvioEpisódio sociológico de
gênese 1
- Brigas dos pais (c/ 13 anos). Nossa casa própria
era recém construída e a mãe queria melhorar os
móveis e decoração da casa. Ela pegou uma parte
do dinheiro que ela ajudava a guardar na conta
conjunta deles para comprar alguns móveis que
faltavam na casa. Já meu pai queria usar o
dinheiro para comprar um torno que utilizaria na
sua oficina. Quando meu pai descobriu que ela
havia usado parte do dinheiro sem falar com ele
ficou furioso. Começaram a discutir num
bate-boca, o pai berrava e mãe também. Eu e meu
irmão estávamos juntos ali na cozinha, eu estava
completamente tenso, meus ombros enrijecidos,
tinha muito ansiedade e rezava para minha mãe
calar a boca, pois sabia que ia virar em agressão
física. Eu estava com muito medo, apavorado e
acovardado, pois meu pai parecia um bicho, mas
minha mãe sempre enfrentava ele. Quando acabou
até os argumentos ele começou a bater nela. Nessa
hora ela chamou o meu nome e pediu para eu
intervir, mas eu não conseguia, eu não tinha
coragem, me borrava de medo, eu era frágil,
fiquei dividido entre ter de ajuda-la e não
conseguir de jeito nenhum em função do medo do
meu pai, experimentava-me impotente, de não ter
como agir ali. Depois que acabou tudo eu fui para
a cama e chorei baixinho, pois eu tinha muita
raiva da minha situação familiar, de ser filho
dessa bruta raça, ignorante, que berra, xinga,
bate na esposa. Eu morria de vergonha da minha
família frente aos vizinhos, pois as brigas deles
eram sempre violentas e provocavam um escândalo
na redondeza. Nunca consegui me experimentar a
vontade em casa, sempre na expectativa da próxima
briga. Aparecia para mim que meu futuro não
poderia ser debaixo daquele teto, não gostava de
estar ali. - .
22Caso Clínico SilvioEpisódio sociológico de
gênese 2 fechamento do cogito
- Apelido no 2 grau Silvio tinha ido, por sua
insistência, para um colégio grande no centro da
cidade, onde estudavam os filhos da classe média.
Sonhava em ir para lá, sair de seu bairro
operário, significava para ele uma ascensão
social. - Eu tinha 15 anos. Era intervalo de aula e um
grupo de alunos bebia cachaça escondido. Eram uns
3 ou 4 caras que se colocavam como os líderes da
minha turma. Eu estava fora do grupo e queria
participar da roda, por isso resolvi fazer um
comentário, como forma de me aproximar. Falei ai
que cheiro de cachaça. Um dos caras começou a
rir e falou para os outros apontando para mim,
viram o jeito que o cara falou ai que cheiron,
imitando um colono italiano grosso, os outros
riram. Fiquei envergonhado, tenso, irado, na
hora, mas tentei não dar bola. O problema é que
depois, onde eu aparecia eles cantavam ai que
cheiron e a turma ria e pegava no meu pé, me
apelidaram de cheiron. Fui tachado de colono!
Logo eu, que sempre odiei o jeito do pessoal do
meu bairro e não queira ser comparado a eles de
jeito nenhum. Ir para a aula passou a ser um
martírio para mim, pois eu tinha de enfrentar a
zombaria. Eu ficava acuado, aflito, tenso, ficava
prostrado, tinha vergonha. Comecei a ter medo de
falar em público e a ter problema de dicção com a
letra R principalmente, coisa que nunca tinha
tido antes. Deixei de participar de aulas e
ficava encolhido no meu canto. Prestava mais
atenção em mim mesmo, imaginando os outros
olhando para mim, vendo o que eu estava fazendo,
sem prestar atenção nas aulas. Eu não tinha só
problemas em casa, agora, mas também no colégio.
A situação foi tão forte que eu reprovei nesse
ano. Até hoje quando eu conto isso eu fico
incomodado.
23Bibliografia
- BERTOLINO, Pedro. Os processos da Ciência. Obtido
no site www.nuca.org.br - em 22/10/04 - BERTOLINO, Pedro et al. (1998). As Emoções.
Florianópolis Nuca Ed.Independentes (Cadernos de
Formação 2). - SARTRE, J. P. Esboço de uma Teoria das Emoções.
Rio de Janeiro Zahar, 1965. - SARTRE, J. P. A Transcendência do Ego. Lisboa
Colibri, 1994. - SARTRE, J. P. O Imaginário psicologia
fenomenológica da imaginação. São Paulo Ática,
1996. - SARTRE, J. P. O Ser e o Nada Ensaio de Ontologia
Fenomenológica. Petrópolis Vozes, 1997. - SARTRE, J. P. Questão de Método. Col. Os
Pensadores. São Paulo, Nova Fronteira, 1987. - SARTRE, J. P. Crítica da Razão Dialéctica. Rio de
Janeiro DPA, 2002. - SARTRE, J. P. Saint Genet ator e martir.
Petrópolis Vozes, 2002. - SCHNEIDER, D. Novas perspectivas para a
psicologia clínica a partir das contribuições de
J. P. Sartre. Interação em Psicologia, UFPR,
2006, 10 (1), p.101-112. - Site do NUCA www.nuca.org.br/comunicações
científicas. Acessado em 22/08/06.
24Obrigado!
- Dra Daniela R. Schneider
- www.psiclin.ufsc.br
- danis_at_cfh.ufsc.br