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Constitucionalismo mon rquico portugu s Rupturas e continuidades A historiografia da Revolu o tem-na glorificado como um acto de ruptura. Ficando, nesse sentido ... – PowerPoint PPT presentation

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Title: Constitucionalismo mon


1
Constitucionalismo monárquico portuguêsRupturas
e continuidades


  • A historiografia da Revolução tem-na glorificado
    como um acto de ruptura. Ficando, nesse sentido,
    prisioneira da imagem que a maior parte dos
    revolucionários faziam da própria revolução.
  • Para uma discussão, em geral, do assunto, há
    bibliografia geral v.g. Spang, Rebecca
    L.   Paradigms and Paranoia How modern is the
    French Revolution?   in The American Historical
    Review, 108 (2003), S. 119-147      
  • No domínio da história constitucional, tende a
    encarar-se o novo constitucionalismo como algo de
    inaugural, sem raízes no Antigo Regime nem
    continuidades de Antigo Regime na leitura das
    novas ideias.
  • A crítica mais  original à historiografia
    constitucional comum foi feita por Fernando
    Martinez Perez, "Ley expresa, clara y
    terminante". Orden normativo y paradigma
    jurisdiccional en el primer constitucionalismo
    español", Historia constitucional. Revista
    electronica de historia constitucional, 3(Junho
    2002), http//hc.rediris.es/tres/indice.html
    (20.11.2004)).

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Continuidades no constitucionalismo ibérico
  • Supervivência do conceito anterior de soberania
    como poder supremo, mas não exclusivo (a fórmula
    preambular da Constituição de 1822)
  • Supervivência da ideia de auto-regulação dos
    corpos políticos (como a Igreja, ou a família,
    cada qual absoluto nos limites das suas
    atribuições jurisdição), que a ordem
    constitucional devia incorporar
  • Concepção da legislação, não como um acto de
    vontade arbitrária, mas como a revelação de uma
    ordem anterior e indisponível, como uma
    deliberação de tipo "judiciário" (englobando um
    "conhecimento de causa" e um "contraditório) ?
    Assimilação das cortes a um "grande conselho" de
    Antigo Regime, decidindo segundo o mesmo processo
    de confronto de "votos
  • Supervivência da ideia de que a tradição (não a
    natureza) gera situações jurídicas (algumas delas
    constitucionais, que as novas constituições devem
    reconhecer ou com as quais se devem acomodar)
    (ex. continuação da dinastia)

3
Continuidades no constitucionalismo ibérico
  • Entendimento das atribuições dos poderes, não
    como resultado de uma definição apriorística,
    baseada na natureza do Estado - como grande
    sujeito que "quer", "executa" e "delibera" -, mas
    como resultado de uma distribuição
    histórico-concreta de competências
  • Supervivência da ideia de que a manutenção da
    constituição está, sobretudo, na reserva das
    jurisdições, quer das pré-constitucionais, quer
    das dos novos "poderes (monarquia limitada),
    garantida por um sistema de contrapesos e de
    controlos (checks and balances, como na
    Constituição inglesa)
  • Supervivência da ideia de que qualquer acto do
    poder pressupõe o acertamento prévio dos direitos
    envolvidos, pelo que a administração não se pode
    fazer sem um momento jurisdicional
  • Identificação dos direitos particulares (não
    necessariamente individuais) com direitos
    historicamente radicados (adquiridos por uso, por
    concessão, geral ou particular), e não
    abstractamente naturais ? Daí que os direitos não
    sejam absolutamente invioláveis, mas violáveis
    desde que se observasse o processo juridicamente
    devido (de acordo com a natureza da sua génese e,
    por isso, não necessariamente jurisdicional).

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História da Revolução de 1820 e da Constituição
de 1822
  • 24 de Agosto de 1824.
  • Um movimento militar proclama a Junta de Governo
    do Porto, encarregada de convocar Cortes para se
    fazer uma constituição que, mantendo a religião e
    a dinastia, remediasse os males do Reino.
  • O governo acede (Instruções de 31.10), sendo
    obrigado por um pronunciamento militar a adoptar
    um sistema directo de sufrágio, igual ao da
    Constituição de Cadiz (arts. 27 a 103 Instruções
    de 22.11).
  • As eleições tiveram lugar em Dezembro de 1820 (no
    ultramar, prolongaram-se até inícios de 1822).
  • O Projecto de Bases da Constituição (1821) é
    apresentado como resultado da reflexão sobre o
    antigo direito público português, mais do que
    sobre teorias políticas modernas.
  • A nova Constituição como regeneração" da memória
    da constituição tradicional.

5
A Nação aparece como a entidade titular exclusiva
da soberania
  • A Nação como "a união de todos os portugueses"
    (art. 20).
  • Nação e Povo.
  • A oposição entre liberdade dos antigos,
    caracterizada pela "participação política" dos
    "cidadãos activos", e a liberdade dos modernos,
    caracterizada pela garantia de não intromissão do
    Estado na esfera dos direitos individuais
    (Benjamin Constant, 1819)
  • ? desvaloriza a participação política universal.
  • Excluem-se do voto
  • (i) os menores de 25 anos (ou, se casados, de 2
    anos
  • (ii) as mulheres
  • (iii) os sujeitos ao pátrio poder, como as
    filhos-família, independentemente da idade, a
    menos que exercessem ofícios públicos
  • (iv) os criados de servir que não vivam em casa
    separada dos patrões (art. 33, II e III)
  • (v) os submetidos à autoridade religiosa regular,
    i.e., os que vivam em comunidades monásticas
  • (vi) os socialmente inúteis, que nada aportavam à
    república, como os vadios (art. 33, IV) aos
    quais se acrescentariam, no futuro, os
    analfabetos adultos (art. 33, VI).

6
Fontes da Constituição de 1822
  • Carta constitucional francesa de 1814
  • Constituição espanhola de 1812 (Constituição de
    Cadiz).
  • Bases da Constituição (1821)

7
A Nação aparece como a entidade titular exclusiva
da soberania
  • Do lado dos que podiam ser eleitos, as restrições
    ainda eram maiores.
  • Exige-se renda suficiente,
  • excluem-se aqueles cujas inclinações naturais
    (falta de senso, irresponsabilidade) ou
    vinculações sociais podem importar diminuição da
    liberdade de opinião os falidos, os que servem
    empregos da Casa Real, os libertos.
  • Excluem-se os estrangeiros, ainda que
    naturalizados, pela presumível falta daquele amor
    à pátria, como coisa orgânica, que só os naturais
    de origem podem ter.

8
Liberdade
  • Como dependência exclusiva da lei (liberdade
    republicana)
  • Como resistência (liberdade "liberal" ou "dos
    modernos")
  • Como participação (liberdade "dos antigos")
  • Repercussão sobre a relação entre lei e
    direitos

9
Soberania
  • Consiste no facto de
  • a Nação não ser património de ninguém,
  • em só poder ser representada politicamente pelos
    seus representantes eleitos
  • e em ter o exclusivo do poder constituinte e
    legislativo (cf. arts. 26 e 27)
  • ? A soberania manifesta-se, antes de tudo, no
    primado da lei, como expressão da
    autodeterminação da Nação (cf. art. 104 "Lei é a
    vontade dos cidadãos declarada pela unanimidade
    ou pluralidade dos votos dos seus representantes
    juntos em Cortes, precedendo discussão pública").

10
Lei e direito
  • Os representantes eleitos da Nação têm o
    exclusivo da legislação (arts. 27, 102, 105,
    110).
  • ? Embora não de fixar o direito. De facto, a
    Constituição não definia as fontes de direito,
    deixando esta atribuição livre nas mãos dos
    juizes.
  • Em Portugal, o conglomerado de ordens normativas
    que constituíam o direito estava definido na Lei
    da Boa Razão, de 18.8.1769.
  • Porém, como esta era imprecisa na identificação
    concreta das fontes direito, a definição destas
    era feita quase livremente pela doutrina ou, caso
    a caso, pelos julgadores.

11
Manifestações do primado da lei
  • Vinculação de todos os poderes, agentes e
    actividades do Estado em relação à lei
  • o poder executivo tem como finalidade "fazer
    executar as leis" (art. 122)
  • os impostos não são obrigatórios se não tiverem
    sido votados em cortes (arts. 224, 234)
  • os funcionários não são proprietários dos seus
    ofícios (art. 13), respondendo pelas violações da
    constituição e das leis (art. 14)
  • as câmaras estão devem obediência às leis nas
    matérias de governo administrativo e económico
    (arts. 216, 218)
  • os direitos individuais são reconhecidos, nos
    limites da lei.

12
Igualdade perante a lei (art. 9)
  • Por ora, ainda não se declaram contrários à
    Constituição outros aspectos da desigualdade
    própria da sociedade de ordens
  • como os direitos senhoriais
  • a desigualdade dos sexos
  • a relevância legal da religião
  • os títulos nobiliárquicos, a escravatura).

13
Divisão de poderes
  • Carácter funcional à defesa da liberdade.
  • Consistindo a liberdade na "exacta observância
    das leis" (art. 2), a questão da divisão de
    poderes - que a doutrina constitucional com
    origem em Montesquieu e na experiência
    constitucional inglesa considerara como pedra de
    toque do constitucionalismo moderno - passa
    necessariamente para um segundo plano.

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Poder legislativo
  • Uma única câmara, eleita de acordo com o sistema
    eleitoral já descrito (arts. 32 ss.).
  • As legislaturas duravam dois anos (art. 41), com
    sessões anuais de três meses (art. 83).
  • Cada deputado representava toda a Nação (art.
    94).
  • As atribuições essenciais das Cortes eram as
    legislativas (a iniciativa, discussão e votação
    das leis, sua interpretação e revogação o
    controlo da observância da Constituição e das
    leis)
  • Mas também de governo a promoção do bem geral da
    Nação a fixação anual dos efectivos militares a
    fixação anual dos impostos e as despesas
    públicas a criação e supressão de empregos
    públicos, bem como a fixação dos respectivos
    ordenados a avaliação da responsabilidade
    (política, criminal e cível) dos secretários de
    Estado e demais funcionários (arts. 102 e 103 e
    ss.).

15
Poder executivo
  • O poder executivo (residual ...) residia no rei e
    tinha como atribuições gerais "fazer executar as
    leis expedir os decretos, instruções e
    regulamentos adequados a esse fim e prover tudo o
    que for concernente à segurança interna a externa
    do Estado, na forma da Constituição" (art. 122).
  • Esta fórmula genérica concedia ao executivo um
    âmbito muito vasto de atribuições, em parte
    concorrente com algumas das atribuições confiadas
    ao Legislativo
  • Os resíduos da royal prerogative ou do princípio
    monárquico.

16
Poder judicial
  • A Constituição revela, nesta matéria, uma tensão
    entre dois pólos.
  • Por um lado, o de garantir a independência dos
    tribunais, que corresponde à ideia do seu papel
    central na defesa do sistema constitucional e na
    defesa pública, imparcial e neutra dos direitos
    dos cidadãos.
  • Mas, por outro lado, a Constituição coloca os
    juizes e oficiais de justiça sob estrita
    vigilância, quanto a abusos e prevaricações, o
    que corresponde à imagem popular de uma justiça
    arbitrária, corrupta e corporativa.
  • Medidas suplementares visavam aumentar a
    confiança popular na justiça. Uma delas era o
    júri eleito (cf. art. 178), julgando sobre a
    matéria de facto, previsto, tanto para as causas
    criminais - expressa e especialmente referida é a
    sua intervenção no julgamento dos delitos de
    abuso da liberdade de imprensa -, como para as
    cíveis.

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Carta Constitucional (1826). História da Carta
  • A Carta constitucional esteve em vigor durante 84
    anos, até ao fim da monarquia, embora com lapsos
  • insurreição miguelista (13.03.1828-26.05.1834)
  • reposição em vigor da Constituição de 1822,
    depois da Revolução de Setembro
    (10.9.1836-4.4.1838
  • vigência da Constituição de 1838
    (4.4.1838-27.1.1842).
  • e modificações, que resultaram das várias
    revisões constitucionais que originaram outros
    tantos actos adicionais
  • 05-07-1852,
  • 24-07-1885,
  • 03-04-1896,
  • 23-12-1907.

18
Fontes da Carta Constituconal
  • A Carta constitucional é promulgada sob o impacto
    filosofia política liberal-aristocrática de
    Benjamin Constant e de François Guizot.
  • Nela se mantém a generalização da cidadania a
    todos os nacionais (agora entendidos como todos
    os nascidos em território português, do Reino ou
    dos seus domínios (arts. 1 e 7) (o que incluiria,
    nomeadamente, as populações não europeias das
    colónias).
  • No entanto, esta generalização corresponde apenas
    à generalização da capacidade de gozo dos
    direitos civis, cuja base a Carta define como
    sendo "a liberdade, a segurança individual e a
    propriedade" e que garante a todos os cidadãos
    (art. 145).

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A cidadania
  • Porém, já ao tratar dos direitos de participação
    política, a Carta - assume implicitamente a
    distinção de B. Constant entre cidadãos activos e
    cidadãos passivos.
  • Apenas reconhece direitos políticos (pelo menos
    na sua vertente de direitos eleitorais, cf. artº
    63) - a alguns
  • nomeadamente em função da sua renda (Cf. arts. 65
    a 68 (de 10000 para ser eleitor a 40000 para
    ser elegível como deputado).
  • O sufrágio indirecto, consagrado nestes artigos
    da Carta (só substituído pelo sufrágio directo
    pelo Acto adicional de 1852) era outro meio de
    "filtrar" a vontade dos menos capazes pela
    mediação dos mais capazes.

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Os direitos e a Constituição.
  • No seu último artigo, a Carta garante os direitos
    civis e políticos
  • "Art. 145 - A inviolabilidade dos Direitos Civis
    e Políticos dos Cidadãos Portugueses, que têm por
    base a liberdade, a segurança individual e a
    propriedade, é garantida pela Constituição do
    Reino, pela maneira seguinte".
  • Concepção de direitos próxima do modelo liberal
    da Europa continental
  • Os direitos são garantidos, e não criados pela
    Constituição ("têm por base a liberdade, a
    segurança individual e a propriedade".
  • São os direitos da sociedade natural, fundados na
    própria natureza do homem, mas tutelados, agora,
    pela sociedade civil.
  • Esta tutela legal é dada, ao mesmo tempo, pela
    Constituição e pelas leis ordinárias,
    designadamente pelas leis civis e pelas leis
    penais.
  • ?"Art. 145 - A inviolabilidade dos Direitos Civis
    e Políticos dos Cidadãos Portugueses, que tem por
    base a liberdade, a segurança individual e a
    propriedade, é garantida pela Constituição do
    Reino, pela maneira seguinte ...".

21
A garantia de direitos
  • O primeiro dos meios de garantia de direitos era
    - na continuação do direito de Antigo Regime - a
    garantia, em relação ao Estado, das esferas
    jurídicas dos particulares protegidas pelo
    direito (pelas leis), assegurando a sua
    intangibilidade ou, pelo menos, o dever de
    indemnizar por parte dos poderes públicos que as
    ofendam.
  • Quanto ao âmbito (aos actos administrativos
    recorríveis e ao fundamento e resultado do
    recurso), o recurso contencioso contra actos da
    administração era, apenas, um contencioso "de
    legalidade",
  • ?escapando-lhe o domínio dos actos do poder que,
    ofendendo direitos, não pudessem ser arguidos de
    ilegalidade, ou seja, que se situassem no domínio
    das opções politicas ("poder discricionário da
    administração").
  • E, por outro lado, o recurso produziria apenas a
    anulação do acto administrativo recorrido, e
    nunca a sua substituição por um outro
    correspondente à legalidade (ou seja, tratava-se
    de um recurso de mera anulação).

22
A garantia da legalidade
  • Numa primeira fase (Decreto nº 23, 1832), a
    possibilidade de apelo reduzia-se aos actos
    administrativos lesivos de direitos patrimoniais.
  • Em 1835 (CL 35.4), as questões contenciosas
    (relativas, portanto a ofensas de direitos pela
    administração) são devolvidas aos tribunais
    comuns, solução que se mantém com o Código
    Administrativo de 1836.
  • O Código Administrativo cabralista de 1842
    organizou de novo tribunais administrativos para
    conhecer dos recursos dos actos da administração
    embora agora com fundamento em qualquer tipo de
    ilegalidade, mesmo que não se ofendessem
    direitos patrimoniais.
  • Em 1870, o Conselho de Estado político separou-se
    do administrativo, dando-se a este o nome de
    Supremo Tribunal Administrativo.
  • Esta tibieza no reconhecimento de direitos dos
    cidadãos contra o Estado e na institucionalização
    de meios de os tornar efectivos era o produto de
    uma longa tradição.
  • Não tanto a tradição do direito comum do Antigo
    Regime. Mas, sobretudo, a tradição combinada do
    absolutismo monárquico setecentista (e, mesmo,
    oitocentista) e do jacobinismo revolucionário.
    Perante o interesse público - fosse ele
    representado pelo rei ou pelo parlamento - o
    indivíduo poucos direitos teria.

23
A garantia da constitucionalidade. Fundamentos
  • O princípio mais comumente aceite era o de que o
    poder estava limitado pela Constituição
  • A Carta tinha sido outorgada pelo rei, como
    representante da Nação (cf. art. 12), nele
    residindo o poder constituinte originário e o
    dever primeiro de "observar e fazer observar a
    Constituição" (art. 76).
  • Daí que
  • (i) as cortes não pudessem alterar a constituição
    sem o acordo do rei, que devia sempre sancionar
    as reformas constitucionais,
  • (ii) que a necessidade de sanção real das leis
    constituísse a primeira defesa em relação à
    omnipotência do legislativo.

24
A garantia da constitucionalidade. Argumentos
literais.
  • (i) o art. 140, ao estabelecer um processo
    legislativo especial para alterar as matérias
    constitucionais da Carta, implicitamente separava
    o poder constituinte do poder legislativo
    ordinário, retirando a este último a faculdade de
    emitir leis anti-constitucionais
  • (ii) o art. 139 dispunha que "as cortes gerais no
    princípio das suas sessões examinarão se a
    Constituição do Reino tem sido exactamente
    observada, para prover como for justo"
  • (iii) as autoridades e titulares de cargos
    públicos tinham que jurar "cumprir e fazer
    cumprir a Constituição"
  • (iv) todo o Cidadão podia "apresentar por escrito
    ao Poder Legislativo, e ao Executivo reclamações,
    queixas ou petições, e até expor qualquer
    infracção da Constituição, requerendo perante a
    autoridade a efectiva responsabilidade dos
    infractores" (art. 145, 28)

25
A questão especial da inconstitucionalidade das
leis
  • Podia dizer-se que uma decisão das cortes que
    obtivesse maioria parlamentar e sanção real tinha
    passado por dois crivos de apreciação da sua
    constitucionalidade, ambos eles revestidos da
    dignidade de representantes da Nação (as cortes e
    o rei).
  • Como o rei detinha também o poder moderador,
    "chave de toda a organização política", a quem
    competia velar "incessantemente sobre a
    manutenção da independência, equilíbrio e
    harmonia dos mais poderes políticos", e que a
    sanção das leis era uma atribuição deste poder (e
    não do executivo, cf. art. 74, 3), a firmeza
    das leis aprovadas pelo rei ainda ficava mais
    reforçada.
  • Percebe-se, portanto, que se manifestasse uma
    resistência séria em admitir que outro órgão de
    soberania - nomeadamente, os tribunais - pudessem
    invalidar ou desaplicar por inconstitucional um
    acto legislativo ?  O único controlo do
    legislativo seria, portanto, político.

26
As garantias institucionais da constitucionalidade
  • Desde os anos '30 que alguma jurisprudência e
    alguma doutrina propunham um controle judicial
    difuso da constitucionalidade.
  • Isto não representava nenhuma inovação em relação
    aos sistema de controlo da legitimidade das leis
    e dos actos de poder em vigor no Antigo Regime.
  • Os argumentos doutrinais
  • Os juízes, como todas as autoridades públicas,
    tinham jurado - no acto de posse "cumprir, e
    fazer cumprir" a Carta e, por isso, não deviam
    poder aplicar legislação que a contrariasse, do
    ponto de vista material, orgânico ou formal.
  • A jurisprudência variou, sendo difícil avaliar a
    orientação dominante na prática judicial
    quotidiana se (i) o acatamento da lei
    inconstitucional, se (ii) a sua desaplicação, por
    contrariar a constituição (desde logo a
    constituição formal, mas também a constituição
    material).

27
A divisão de poderes
  • A Carta foi uma das poucas constituições
    oitocentistas que se afastou da clássica
    tripartição de poderes.
  • Partindo do princípio de que "a divisão e
    harmonia dos Poderes Políticos é o princípio
    conservador dos Direitos dos Cidadãos, e o mais
    seguro meio de fazer efectivas as garantias"
    (art. 10),
  • a Carta estabelece quatro poderes (o legislativo,
    o moderador, o executivo e o judicial),
  • dos quais um (o moderador) é definido como "a
    chave de toda a organização política" (art. 71)
  • todos menos um (o judicial) estão nas mãos dos
    "representantes da Nação portuguesa" ("o rei e as
    cortes gerais", art. 12).

28
O poder moderador. Competências
  • No sistema da Carta (art. 74), as atribuições do
    poder moderador são
  • a nomeação de pares sem número fixo
  • a convocação extraordinária das cortes "quando
    assim o pede o Bem do Reino",
  • a sua prorrogação, adiamento ou dissolução
  • a sanção dos decretos das cortes, para que tenham
    força de Lei
  • a livre nomeação e demissão dos ministros
  • o perdão de penas e a amnistia.

29
Poder moderador. Críticas
  • No entanto, esta hegemonia do poder moderador
    supunha o prestígio da instituição real.
  • Na sua falta, surgem críticas de natureza
    teórica, questionando a hierarquização dos
    poderes do Estado sob a hegemonia do rei.
  • Uns pronunciam-se,
  • ou pela supremacia do legislativo, de acordo com
    a lógica representativa,
  • ou do judicial, como poder naturalmente
    especializado na resolução de diferendos.
  • Outros críticam a confusão entre funções do
    Executivo e funções do Moderador que, na prática,
    significavam a rentabilização pelo executivo das
    prerrogativas do poder moderador.
  • De facto, depois do estabelecimento do
    rotativismo parlamentar (maxime nos anos
    1851-1865 mas sobretudo 1878-1890), a existência
    de um poder moderador, mal se justificava, até
    porque o Acto Adicional de 1896 sujeitou os actos
    do poder moderador à referenda ministerial.

30
O poder legislativo. A Câmara dos Deputados.
  • O poder legislativo residia nas cortes e no rei
    (" compete às Cortes, com a sanção do rei",
    art. 13). As cortes compunham-se de duas câmaras
    - a Câmara dos Pares e a Câmara dos Deputados.
  • A Câmara dos Deputados era constituída por um
    número de deputados - originalmente nomeados por
    eleição indirecta (art. 63) e censitária -
    proporcional à população das circunscrições
    eleitorais.
  • A eleição indirecta era apresentada como uma
    forma de compatibilizar um certo alargamento do
    direito de sufrágio com a fiabilidade das
    escolhas o povo participava, mas apenas
    confiando a pessoas mais capazes a designação
    definitiva dos seus representantes.
  • A Carta (bem como a Const. de 1838) estabelecia
    um sufrágio restrito, em que o direito de voto
    apenas era concedido aos maiores de 25 anos que
    tivessem um rendimento mínimo de 100 00000. Para
    dar uma ideia do que isto podia significar, um
    elemento de referência uma jorna diária, pelos
    meados do séc., era de c. 650 rs... Em termos
    europeus, não se tratava de um valor muito
    elevado.
  • O Acto Adicional de 1852 inaugurou um outro
    modelo, em que o rendimento mínimo podia ser
    suprido por habilitações literárias mínimas ou,
    mais tarde (1878), também pela qualidade de chefe
    de família. Em qualquer caso, o universo dos
    votantes ficava muito aquém de abranger toda a
    população.

31
O poder executivo
  • O poder executivo residia no rei, que o exercia
    pelos seus ministros (ou "secretários") de Estado
    (art. 75).  
  • Todas estas atribuições eram da responsabilidade
    do rei.
  • No entanto, sendo este inviolável e sagrado (art.
    72), era necessário que alguém assumisse a
    responsabilidade política e até criminal dos seus
    actos. Era esta a finalidade do instituto da
    referenda ministerial (art. 102), que obrigava os
    ministros a referendar e assinar "todos os actos
    do poder executivo, sem o que não poderão ter
    execução". Esta assinatura responsabilizava o
    ministro pelo acto praticado, em termos de este
    nem sequer se poder eximir invocando a ordem real
    (art. 105).
  • Embora isto não transpareça da ordem de
    enumeração do art. 75 da Carta, o núcleo mais
    permanente das atribuições do executivo é o
    "governo" e, dentro deste, a "administração".

32
O poder legislativo. A Câmara dos Pares.
  • A Câmara dos Pares era, originariamente,
    constituída por pares vitalícios e hereditários,
    nomeados pelo rei, sem número fixo (art. 39).
  • Embora correspondesse a um modelo muito comum nos
    Estados europeus, a sua justificação era
    problemática.
  • Alguns autores - como o monárquico conservador
    Royer Collard - justificavam-na como "auxiliar do
    rei, para as ondas democráticas não abalarem
    constantemente o trono".
  • Outros - como François Guizot - relacionavam a
    sua existência com o facto de, na sociedade,
    alguns cidadãos terem sempre "uma maior
    autoridade do que os outros, pela riqueza, pelo
    esplendor de nascimento, pelos merecimentos ou
    pela reputação estes cidadãos formam uma
    ordem social distinta, e por isso deve-se-Ihes
    dar na constituição lugar que ocupam na
    sociedade".

33
O poder executivo.
  • O poder executivo residia no rei, que o exercia
    pelos seus ministros (ou "secretários") de Estado
    (art. 75).  
  • Todas as suas atribuições eram da
    responsabilidade do rei.
  • No entanto, sendo este inviolável e sagrado (art.
    72), era necessário que alguém assumisse a
    responsabilidade política e até criminal dos seus
    actos. Era esta a finalidade do instituto da
    referenda ministerial (art. 102), que obrigava os
    ministros a referendar e assinar "todos os actos
    do poder executivo, sem o que não poderão ter
    execução".
  • Esta assinatura responsabilizava o ministro pelo
    acto praticado, em termos de este nem sequer se
    poder eximir invocando a ordem real (art. 105)
    mas limitava o poder do rei, ao exigir a
    cooperação de um ministro.
  • Embora isto não transpareça da ordem de
    enumeração do art. 75 da Carta, o núcleo mais
    permanente das atribuições do executivo é o
    "governo" e, dentro deste, a "administração".

34
Poder executivo ou poder governamental ?
  • As atribuições do governo vêm referidas nos 3
    e 4 (nomeação de magistrados e funcionários), 12
    (expedição de decretos, instruções e
    regulamentos adequados à boa execução das Leis e
    13 (prover a tudo que for concernente à
    segurança interna e externa do Estado, na forma
    da Constituição).
  • De facto, quem ler desatentamente a enumeração de
    funções do art. 75, ficará com a ideia de que o
    executivo se limitava a assegurar passivamente as
    clássicas funções de execução das leis e de
    defesa. Isto estava, porém, bem longe de ser
    verdade.

35
Poder executivo ou poder governamental ?
  • As outras atribuições do executivo eram
  • Convocar as novas Cortes Gerais ordinárias
    teoricamente, esta atribuição devia competir ao
    poder moderador ( 1.)
  • Nomear ou prover dignidades eclesiásticas e
    nomear magistrados e demais empregos civis,
    políticos, militares e diplomáticos ( 2, 3, 4,
    5 e 6)
  • Dirigir a política externa ( 7, 8 e 9)
  • Conceder Cartas de naturalização e distinções (
    10 e 11)
  • 13. - Decretar a aplicação dos rendimentos
    destinados pelas Cortes nos vários ramos da
    Pública Administração
  •  14. - Conceder ou negar o beneplácito aos
    documentos eclesiásticos que se não opuserem
    à Constituição, e precedendo aprovação das
    Cortes, se contiverem disposição geral.

36
Poder executivo ou poder governamental ?
  • Uma vez passada a onda fisiocrática que era,
    sobretudo, uma reclamação de liberdade cidadã
    perante a organização corporativa e, depois,
    perante o Estado de polícia, o Estado liberal
    continental cujo protótipo (e não a excepção) é
    o Estado administrativo e empreendedor do I
    Império francês  encarregou-se da função de
    estabelecer a ordem e de garantir a estabilidade,
    o que não excluía um pronunciado dirigismo
    económico, social e político.
  • Neste sentido, a função dita executiva
    transformou-se progressivamente numa função
    autonomamente activa e politicamente dominante
    quase todos os actos do Estado eram, na verdade,
    actos executivos, descontados os comparativamente
    raros actos legislativos e os dispersos e de
    impacto essencialmente inter partes - actos
    judiciais.
  • Isto já era assim no momento em que a Carta
    surgiu. Mas, durante a sua longa vigência,
    sê-lo-á cada vez mais, nomeadamente quando o
    Estado se passa a ocupar de tarefas de fomento
    metropolitano e colonial, da educação e, até, de
    assistência e de regulação industrial.
  • Também na constituição inglesa haveria que
    distinguir uma constituição teórica, dominada
    pelo princípio dos checks and balances e uma
    constituição prática, em que ao governo vinham
    a caber atribuições materialmente legislativas.

37
Governo e parlamento
  • Segundo a lógica do parlamentarismo, vigorava o
    princípio da responsabilidade do governo perante
    as câmaras e a consequente necessidade de que ele
    reflectisse o equilíbrio das forças políticas no
    parlamento.
  • Este relevo do parlamento era, porém, mitigada
    pelo princípio monárquico ou prerrogativa
    régia, correspondente à existência do poder
    moderador, que dava uma certa margem de imposição
    de um executivo sobre o legislativo (governos sem
    apoio parlamentar, nomeação de pares para que o
    governo tivesse maioria na câmara alta, adiamento
    ou dissolução da Câmara dos Deputados).
  • O governo praticava actos normativos que cabiam,
    em teoria, ao poder legislativo decretos com
    força de lei (ou decretos ditatoriais), a que as
    cortes raramente negavam a ratificação e que os
    tribunais costumavam aceitar como válidos
    decretos emitidos pelo governo por delegação
    legislativa das cortes regulamentos inovadores
    (a distinção entre lei e regulamento era
    difícil).
  • Para além dos actos normativos, o executivo
    tomava decisões casuístas, ao abrigo da lei ou no
    âmbito dos seus poderes discricionários. Desde
    cedo, que parte destes actos (os actos políticos)
    foram qualificados como insindicáveis quanto á
    sua legalidade. Isto queria dizer era que,
    doravante, também o governo podia propor
    finalidades ao Estado com aquela liberdade que,
    até então, fora privativa do legislador. O que
    constituía uma evolução político-constitucional
    notável.

38
A governamentalização do poder
  • O que agora se verifica, porém, é que nem o
    parlamento tem a possibilidade de fiscalizar toda
    a frenética actividade governativa, nem pode
    escapar aos poderes de condicionamento de que o
    governo dispõe, nomeando funcionários, gerindo a
    atribuição de benesses, lançando melhoramentos,
    apoiando empresas, concedendo serviços.
  • O nosso governo parlamentar enferma de três
    vícios O excessivo predomínio do poder
    executivo a má constituição do parlamento a
    defeituosa organização dos partidos políticos. O
    excessivo predomínio do poder executivo determina
    a subordinação do parlamento e tira-lhe toda a
    independência para fiscalizar os actos deste
    poder. Desse excessivo predomínio do poder
    executivo na nossa vida politica, é que resultam
    as frequentes ditaduras e delegações das funções
    legislativas no governo. É necessário reforçar o
    poder legislativo e para isso encontramos
    suficientes três disposições da proposta de 14 de
    marco de 1900 a reunião das cortes por direito
    próprio, a restrição da faculdade da sua
    dissolução e a não aplicação pelo poder judicial
    dos decretos, regulamentos ou ordens do governo
    que não sejam conformes às leis É certo que
    alguns escritores, como Poinsard, mostram-se
    favoráveis à aplicação entre nós do regímen
    simplesmente representativo, não atendendo afinal
    a que o mal de toda a nossa vida constitucional
    tem sido o excessivo predomínio do poder
    executivo, que aquele regímen ainda viria a
    fortificar   (Marnoco e Sousa, Direito
    político , cit.,, 386).

39
A encarnação institucional do Estado
  • Embora a Carta não estabelecesse o número de
    secretarias de Estado (ao contrário do que
    acontecia na Constituição de 1822 Negócios do
    Reino, Justiça, Fazenda, Guerra, Marinha e
    Negócios Estrangeiros), logo em 1834, D. Pedro
    II provê as seis secretarias de Estado
    tradicionais. Em 1852 (30.8), cria-se a
    Secretaria de Estado das Obras Públicas, Comércio
    e Indústria, correspondendo ao novo ênfase posto
    nas políticas de fomento do fontismo. Em 1870
    (22.6), Saldanha cria, em ditadura, o Ministério
    da Instrução Pública (que é efémero).
  • Crescimento do aparelho de Estado, em termos
    financeiros e humanos.

40
Crescimento do número de funcionários
41
Crescimento do número de funcionários (sem
militares)
42
Crescimento do número de funcionários (sem
militares)
43
Os partidos e a gestão dos funcionários
funcionários
  • A regeneração quando subiu ao poder em 1871
    foi renovando o pessoal das secretarias,
    promovendo reformas, criando lugares,
    determinando aposentações, concedendo benefícios.
    O partido progressista entrando para o poder
    encontrou este estado de coisas que devia
    respeitar, e respeitaria do certo, se os
    beneficiados da regeneração cumprissem o seu
    dever, que era completa abstenção no acto
    eleitoral. Este dever foi-lhes recomendado
    expressamente com a devida cominação de penas.
    Como o dever não foi cumprido, os efeitos
    fizeram-se sentir. Nada mais natural nada mais
    justo, António Cândido Ribeiro da Costa,
    Discurso proferido na Câmara dos Senhores
    Deputados nas sessões de 17 e 18 de Fevereiro de
    1880, Lisboa, 1880(p. 31).
  • O mecanismo está bem descrito. O fundo de postos
    burocráticos era utilizado pelos governos para
    distribuir benesses e para suscitar o
    empenhamento partidário dos beneficiados. O
    crescimento dos efectivos burocráticos potenciava
    ainda a importância política desta troca

44
Dependência dos funcionários
45
Dependência dos funcionários
  • Quanto ao carácter dependente e precário das
    classes médias e inferiores do funcionalismo,
    estes funcionários seriam mal pagos, crivados de
    deduções (que atingiam, em média, 40 dos
    proventos), apenas podendo sobreviver com base em
    benesses distribuídas superiormente (comissões,
    gratificações, horas extraordinárias, serões e
    abonos vários). Os próprios funcionários
    administrativos superiores (directores-gerais e
    chefes de repartição) estariam dependentes, pelos
    mesmos mecanismos, dos titulares das pastas
    (ibid.). Para além de que o ingresso e progresso
    na carreira se faziam, em geral, por mecanismos
    de escolha, garantindo novas fidelidades.
  • O funcionário nem sequer estava garantido contra
    um despedimento arbitrário ou punitivo, pois se
    entendia que o funcionário não tinha direito ao
    lugar, podendo ser despedido por necessidades do
    serviço.
  • Para se obter a melhor execução da lei, é
    necessário que os executores dela sejam
    responsáveis pelos seus actos as garantias da
    sociedade e do individuo dependem mais da fiel
    execução da lei, do que da sua bondade absoluta.
    A boa execução da lei depende igualmente da
    competência, saber, zelo e honradez dos seus
    executores e para que estes requisitos sejam uma
    realidade é indispensável que o ministro possa
    livremente escolher os subalternos, e demiti-los
    sem prévio julgamento para que o chefe de cada
    ramo da administração seja responsável é
    necessário que ele possa tornar efetiva a
    responsabilidade dos seus subordinados (António
    Pereira Jardim, Princípios de finanças ...,
    Coimbra, 1873).

46
Centro e periferia pluralismo e
descentralização.
  • Em geral, estabelece-se como axioma que os
    poderes dos vários órgãos e agentes do Estado não
    são originários, como consequências naturais das
    suas funções ou estatuto, mas antes provenientes
    de um acto de delegação dos órgãos de soberania.
    A ideia de delegação constitui, doravante, facto,
    um princípio essencialmente contemporâneo de
    construção do aparelho de Estado.
  • Esta nova ideia é visível quando confrontado com
    o discurso da descentralização, pois por aí se vê
    de forma particularmente clara a distinção entre
    o sistema pluralista do Antigo Regime, recusado,
    e o sistema monista descentralizado, agora
    proposto.
  • O Estado, que tinha por base os municípios, era
    um corpo formado de membros desconexos, a que
    faltava a vida de relação, a unidade e a
    harmonia, que só podem provir da aplicação de
    princípios gerais estribados na justiça e no
    direito, e inspirados pelo interesse comum ....
    O municipalismo multi-forme, incoerente,
    individualista, privilegiado e bárbaro da idade
    media não era a descentralização administrativa,
    era o fraccionamento do Pais em circunscrições
    isoladas e às vezes hostis ... era a negação de
    todos os princípios gerais de direito politico,
    civil e criminal, a condenação de toda a economia
    publica, a supressão de todo o viver nacional, o
    menosprezo de todos os interesses gerais, e o
    impedimento de todo o progresso e civilização da
    sociedade. (Joaquim Thomaz Lobo dÁvila, põe em
    destaque, nos seus importantes Estudos de
    Administração , 1874, p. 19).
  • No entanto, a questão da centralização /
    descentralização não tinha uma única leitura. Foi
    antes uma questão polémica que percorreu todo o
    séc. XIX

47
Sociologismo, institucionalismo e descentralização
  • O institucionalismo dos finais do séc. XIX
    reforça as ideias descentralizadoras. Era por
    meio dela que se produziria uma repartição das
    funções da administração pública entre 1. órgão
    da administração do Estado, centrais e locais 2.
    autarquias territoriais 3. autarquias
    institucionais 4. particulares, por concessão.
  • São estas as influências que se fazem já sentir
    na obra de José Frederico Laranjo, quando afirma
    que, para que haja descentralização
    administrativa, é preciso que haja o exercício
    livre das atribuições dos corpos locais por eles
    mesmos, sem ingerência do governo, além da
    inspecção, para submeter os seus actos ao poder
    judicial, quando eles contrariem as leis.
  • De qualquer modo, e apesar de uma contínua
    corrente doutrinal anti-centralizadora por
    vezes com alguma expressão legislativa, como nas
    reformas de 1836 e no Código administrativo de
    1878 -, a estadualização da vida política não
    cessou de se acentuar.
  • A nova organização do poder governativo
    encontrava-se muito mais apta, apesar da
    debilidade das suas extensões periféricas, a
    desempenhar as funções de uma administração
    activa, pelo progresso das suas estruturas e
    organização no sentido de uma administração deste
    tipo

48
A redução dos poderes periféricos os senhores
de terras
  • Os senhorios não constituíam já, do ponto de
    vista político, o mais importante concorrente da
    coroa. Na verdade, no sistema político português
    do Antigo Regime, os senhores apenas gozavam da
    jurisdição intermédia.
  • Em 1792, extingue-se a jurisdição dos donatários
    - no sentido em que estes a tinham no Antigo
    Regime, isto é, como jurisdição intermédia -,
    embora saiam reforçados os seus poderes de nomear
    ou confirmar justiças locais, agora atribuídos
    genericamente, com o que se abole um anterior
    princípio de que a eleição das justiças era, em
    geral, dos povos. O poder senhorial perde em
    relação à coroa, mas ganha algo em relação ao
    poder municipal.
  • Finalmente, as constituições (Const. 1822, tit.
    V Carta, tit. VI) e a reforma judiciária (Dec.
    nº 24, de 16 de Maio de 1832) acabam de vez com
    as jurisdições dos donatários.

49
A redução dos poderes periféricos a Igreja
  • No Antigo Regime, a jurisdição eclesiástica
    incluía a sua autonomia de governo e a existência
    de um foro espiritual (que abarcava causas de
    natureza temporal).
  • Quanto à nomeação de bispos os bispos estavam
    sujeitos à inspecção do governo gozando, em
    contrapartida, de honras, prerrogativas (v.g.,
    eram conselheiros, pares, grandes do Reino,
    vogais natos, órgãos administrativos) e
    remuneração civil.
  • Quanto aos párocos, eles eram considerados,
    durante o regime constitucional monárquico, como
    empregados espirituais e civis, pelo que a sua
    nomeação resultava da apresentação régia. As suas
    funções espirituais são
  • o governo interno da sua comunidade paroquial
  • vastas funções civis, abrangendo campos como as
    operações eleitorais, o recrutamento militar, a
    colaboração na administração civil das freguesisa
  • Quanto ao foro eclesiástico. Em 1821, foi abolido
    o Conselho-Geral do Santo Ofício e as devassas do
    ordinário. Em 1832, a Reforma Judiciária (Decreto
    n.º 24, de 16 de Maio) extingue o foro
    eclesiástico nas causas temporais ou de foro
    misto (artigo 117) mesmo nas espirituais, a
    competência punitiva dos bispos é limitada a
    penas espirituais, pelo Decreto de 19 de Julho de
    1833.

50
A redução dos poderes periféricos a Igreja
  • Em todo o caso, houve alguns domínios da
    jurisdição da Igreja que, durante todo o século
    XIX, se mantiveram intactos.
  • Um deles foi o da competência jurisdicional da
    Igreja em matéria de casamentos católicos,
    dominantes no País, que continuaram, mesmo depois
    do Código Civil, a ser regulados, no plano das
    relações pessoais, pelo direito canónico.
  • Outra reserva jurisdicional - agora ao nível do
    direito vivido, que não do direito oficial -
    diz respeito ao papel das autoridades
    eclesiásticas (sobretudo os párocos, mas também
    as confrarias ou irmandades) como ordenadoras da
    vida colectiva e como mediadoras informais de
    conflitos nas comunidades rurais, sobretudo no
    Norte do País.

51
A redução dos poderes periféricos Concelhos ou
Municípios
  • Para as correntes revolucionárias, o poder das
    câmaras tradicionais era um dos alvos a abater.
    Nas cortes vintistas, as posições oscilaram entre
    os que as queriam manter, mas democratizadas, e
    os que as queriam substituir, mais ou menos
    claramente, por órgãos periféricos do Estado.
    Esta última foi a orientação que prevaleceu
    (administradores gerais).
  • As reformas financeira, administrativa e judicial
    de Mouzinho da Silveira, de 16.5.1832, estabelece
    um novo sistema, em que as câmaras são despojadas
    de todos os poderes executivos, confiados agora a
    funcionários governamentais, e em que a
    elaboração de posturas passa a carecer de
    aprovação superior .
  • Esta foi a orientação que prevaleceu até ao fim
    da monarquia.
  • Em síntese, importa dizer, quanto a este aspecto,
    que com a política de centralização
    administrativa se obtêm dois resultados. Por um
    lado, desarticula-se um pólo periférico de poder.
    Mas, por outro, cria-se um dispositivo político
    ao tornar disponíveis para o poder central
    algumas milhares de cargos públicos distritais e
    concelhios, atribui-se ao poder central a
    possibilidade de disciplinar pela positiva,
    comprando fidelidades com cargos e alargando,
    assim, a rede da sua influência social.

52
O Poder judicial
  • A Carta constitucional de 1826 parece limitar um
    pouco mais a esfera de autonomia dos juízes, ao
    estabelecer, art. 119, que Os jurados
    prenunciam-se sobre o facto, e os juízes aplicam
    a lei (sublinhado meu).
  • O artigo, porém, parece ter em vista, não tanto a
    questão das fontes de direito, mas antes a
    distinção entre as funções dos jurados e dos
    juízes. Tanto mais que a responsabilização dos
    juízes continua a limitar-se a casos de abusos
    do poder e prevaricações, ou a delitos e erros
    de ofício (arts. 123 e 131). No entanto, há
    outros indícios que apontam neste sentido de um
    entendimento da função de julgar como dependendo
    de critérios mais alargados do que a simples
    observância da lei.
  • O desenho constitucional do poder judicial não
    oferece grandes singularidades. Os princípios
    clássicos da independência judicial - garantida,
    nomeadamente, pela inamovibilidade (ou
    perpetuidade) dos juízes -, do julgamento por
    júri, da responsabilidade dos agentes da justiça,
    da publicidade e simplificação processual, da
    garantia do foro natural e da garantia de recurso
    estão consagrados.

53
O Poder judicial
  • O sentimento antiletrado polarizou-se em três
    questões - a da admissão do júri, a do âmbito das
    instituições não judiciais de resolução de
    conflitos e a das magistraturas electiva.
  • Quanto ao júri a questão politicamente mais
    emblemática - ele era considerado pelo pensamento
    liberal como uma das garantias basilares da
    liberdade civil. Por isso, foi admitido
    facilmente em 1822, como instância de apuramento
    dos factos, tanto nas causas cíveis (onde a sua
    intervenção foi, todavia, menos pacífica) como
    nas causas crime.
  • A reforma judicial de Mouzinho (Decreto nº 24, de
    16.5.1832), tornou obrigatória a sua intervenção
    em todas as causas, na decisão da matéria de
    facto. A limitação das funções do júri à
    apreciação da matéria de facto era, já de si, uma
    solução moderada, pois deixava aos juízes de
    direito aspectos decisivos da questão.
  • Todavia, o júri - sobretudo no cível - era
    objecto de críticas severas, baseadas no
    tecnicismo das questões jurídicas e na falta de
    aptidão dos leigos para lidar com elas, mesmo nos
    aspectos de facto.
  • O desenho constitucional do poder judicial não
    oferece grandes singularidades. Os princípios
    clássicos da independência judicial - garantida,
    nomeadamente, pela inamovibilidade (ou
    perpetuidade) dos juízes -, do julgamento por
    júri, da responsabilidade dos agentes da justiça,
    da publicidade e simplificação processual, da
    garantia do foro natural e da garantia de recurso
    estão consagrados.

54
A independência dos tribunais a teoria e a
prática
  • Apesar de todas as garantias de independência da
    magistratura, a opinião corrente não era tão
    lisonjeira. Céptico quanto ao alcance real das
    excelências da magistratura cartista,
    nomeadamente quanto à sua independência, se
    mostra, por exemplo, Trindade Coelho
  • "O poder judicial é independente (Carta, art.
    118.) e sem embargo das causas legais que
    conspiram contra a independência do poder
    judicial, este é, ainda hoje, um dos mais
    respeitáveis do Estado. Com efeito, a
    independência do poder judicial vai sendo mais
    nominal do que efectiva. Os magistrados que o
    constituem não só são nomeados pelo poder
    executivo, art. 75. 3., mas são colocados
    nesta ou naquela comarca (melhor ou pior sob o
    ponto de vista económico ou da situação
    geográfica) à mercê, exclusivamente, da vontade
    do respectivo ministro, ou seja do poder
    executivo e conquanto inamovíveis durante seis
    anos, salvo nos casos e termos legais, tem-se
    visto alterar a classificação de uma ou outra
    comarca só para o efeito de desalojar dela o
    respectivo juiz, que por algum motivo não agrada
    à política. Acresce que os juízes se vêem
    forçados a fazer obra constantemente por decretos
    inconstitucionais do poder executivo, para
    evitarem o ser incomodados - que as suas
    sentenças em matéria crime podem ser revogadas
    pela acção privativa do poder moderador - que as
    suas próprias decisões em matéria cível são, não
    raro, contrariadas pelo executivo, quando tais
    decisões afectam o Estado em beneficio dos
    direitos do cidadão - que em relação a várias
    categorias de funcionários a acção judicial
    criminal depende de autorizações do governo,
    Código Administrativo, art. 431. (garantia
    administrativa) etc. E, como se tudo isto não
    bastasse, a própria função de julgar tem sido
    cometida, não só a tribunais e estações especiais
    de variadíssimas categorias, estranhas ao poder
    judicial, mas inclusive a funcionários do poder
    executivo, de bem inferior situação na escala
    hierárquica, e portanto sem habilitações" 
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